30 de abril de 2008

Canto de Sempre


Aqui nesta praia onde
Não há nenhum vestígio de impureza,
Aqui onde há somente
Ondas tombando ininterruptamente,
Puro espaço e lúcida unidade,
Aqui o tempo apaixonadamente
Encontra a própria liberdade.

SMBA

Oito taças de champanhe
bebidas com a alegria
do balanço de um carrossel
ondulante e colorido
repetindo incansavelmente
um mesmo desejo:
o de iluminar os teus dias
e adocicá-los como trouxas de ovos moles
em canastas de vime
embrulhadas em fitas e celofane
de
timbre de violino.


28 de abril de 2008

Gaza

in jornal Público, 27 de Abril 2008,
Foto AFP

Não me motivam particularmente as fotos ou as reportagens de guerra. Mas reconheço nos fotógrafos de guerra e de catástrofes um mérito e uma incapacidade invulgar de captar num instante todo o dramatismo de um momento que pode ser o último, ou o pós-último, na vida de uma pessoa. Dito isto, as fotografias de Robert Capa na praia de Omaha, ou a do combatente que cai mortalmente atingido diante da objectiva de Capa na guerra civil de Espanha, são ícones máximos dentro do género fotografia de guerra. Estas fotos retratam apenas a faceta dos conflitos, mas outras há que vão mais além e expõem verdadeiramente o mal, a natureza humana, a atrocidade. Não apenas da guerra, mas também da fome, da miséria, do lado diabólico da existência humana. Tais fotos têm a particularidade de chamar a atenção para causas que de outro modo cairiam no esquecimento (e faz parte da natureza humana procurar esquecer, não ver) o inferno em que por vezes se torna a existência de outros. Olhamos muitas vezes para as fotografias que nos chegam, mas não as vemos verdadeiramente, não nos detemos perante elas, não imaginamos por um instante o que encerram.
E estamos a falar da parte visível da fotografia. Porque em cada fotografia há uma parte invisível, mas que esteve lá, que aconteceu. A parte visível é o resultado de um conjunto de factores, de uma convergência de acontecimentos que se sucederam e combinaram para produzir aquele resultado que fica patente. Como linhas (de vida) que se interseccionam entre si, ou paralelamente se estendem ou, ainda, convergem para o centro (como na foto acima). Assim as vidas do atirador e da vítima do disparo, a da trajectória do projéctil em direcção ao corpo, da baioneta que perpendicularmente ao batimento do coração o penetra, rasgando linhas de tecidos num peito. Não há aqui nenhuma beleza, evidentemente, nem isso pode sequer ser discutido. O problema está na vertente ética que está associada a esta questão (fotografar/não fotografar, publicar/não publicar). Porque há uma evidente diferença entre a reportagem de um campo de batalha, onde pouco tempo há para pensar, calcular ângulos, luminosidade, distância e a fotografia de um campo de refugiados onde crianças enfraquecidas morrem de fome e doença, com abutres sobrevoando a paisagem, ou poisando em árvores próximas como aguardando pela sua presa.
Exploração? Horror? A ética do fotógrafo cinge-se ao dever de não interferir, ou deve interferir, alterando o curso da história natural? Em última instância, a presença da câmara em si provoca a alteração dos acontecimentos? O sul-africano Kevin Carter fez fotografias em vários teatros africanos, desde o Darfur, à Somália, passando pela Libéria, Uganda, Ruanda... É dele a fotografia do abutre poisado a escassos metros de uma criança cujos pais morreram e, abandonada, se arrasta para fora de uma aldeia em África no limite das suas forças O abutre aguarda pacientemente, no solo, pela morte da criança. Outra foto famosa de Carter: num dos conflitos entre facções sul-africanas, era costume amarrar os prisioneiros, colocar-lhes um pneu no pescoço e deitar fogo a este. Carter tirou uma fotografia destas, uma das últimas, porquanto teve consciência que essa foto pode ter sido tirada apenas porque a presença da objectiva pode ter estimulado os carrascos para a matança. Carter não teve a certeza, mas a incerteza atirou-o para uma depressão que, cumulada com um divórcio e dívidas, o levaram ao suicídio.
Esta a terceira parte da equação das fotos de guerra. O fotógrafo não é imune ao que se passa diante, nem fora do campo de visão da objectiva. Mais do que a ética, existe uma sensibilidade humana que fica alterada (violentada?) pela captação da imagem. Diz-se que Picasso fotografou ou recolheu fotos de Guernica (embora não tenha lá estado durante o conflito) e que essas fotos o inspiraram e levaram a pintar o quadro do mesmo nome. O certo é que no espólio do pintor foram encontradas diversas fotografias, mas nestas não existiam pessoas, apenas objectos e paredes destruídas, ou semi-destruídas, fotografias de fotografias de pessoas que podiam ter desaparecido na sequência ou em virtude do conflito.

Na foto acima, tirada há poucos dias por um correspondente da France-Press em Gaza, existe uma perfeita convergência de linhas em direcção ao orifício no centro da fotografia, motivada pelo impacto de um projéctil (isto pode ser melhor constatado se se clicar na foto, porquanto tem boa definição). Através do orifício vislumbra-se um rosto humano, como que um alvo, porventura no mesmo local onde outro ser humano pode ter sido anteriormente abatido. O fotógrafo está no lugar de um eventual atirador, uma vida depende do gesto de pressionar o "gatilho". Os buracos de balas na parede intensificam o dramatismo, a parede atrás do rosto humano, em tijolo nú acentua a precariedade da habitação dado o facto de estarmos perante o cenário de um teatro de guerra, numa das zonas mais conflituosas do mundo.

Esboços

Somos iguais tu e eu
a cada grito de alma
à procura de um abrigo
da tempestade.
Somos iguais nas cores
com que pintamos o céu cinzento
nas tardes chuvosas,
Nas tonalidades equívocas com que camuflamos
luares irrepetíveis
e manhãs submersas
em lençois infinitamente compridos,
mas nunca suficientemente brancos
para neles se esgotarem as aguarelas dos esboços
da tela perfeita com que hei-de pintar
a linha da vida na palma da tua mão.

23 de abril de 2008

Rebentação

Xavier escolheu um livro ao acaso de entre os muitos que resgatara da sua vida passada. Enquanto o folheava, de dentro caiu uma página rasgada rabiscada e amarelecida pelo tempo. Abaixou-se para a apanhar do chão e leu-a, decifrando a custo a sua própria caligrafia:
.
Uma noite passada em vigília
uma longa noite
povoada de sorrisos lindos
reflectidos nas estrelas
desagua, ao amanhecer, num oceano oco
pleno de certezas mortas,
cachos de ondas rebentando contra um sólido dique
construído do lado errado do mar.
.
Tentou, em vão, recordar-se em que circunstância escrevera aquelas palavras. O fogo crepitava na lareira recentemente estreada. Abriu a janela de par em par, mas apenas o vento do Norte soprava e uma corrente de ar fê-lo tornar a fechá-la. Guardou o retalho de papel dentro do livro que conservava na mão e atirou-o para o fogo, deitando-se no sofá sem olhar para trás. O cheiro do papel queimado inundou o compartimento, pareceu querer reclamar uma parte das suas memórias, mas por fim sucumbiu ao aroma do azinho. Xavier fechou os olhos e pouco depois adormeceu profundamente.

21 de abril de 2008

Brevíssimo ensaio sobre o silêncio em cem (ou sem) palavras

Perguntavam-me há dias do que gosto nas palavras e eu: não sei, mas fiquei a pensar. A pensar, pois. Ainda há pouco. Mas uma resposta: do silêncio. Do silêncio, perguntaram-me então. E eu: do silêncio, tornei a responder. E é. Verdade. Do silêncio. Mais do que das palavras, das sílabas, da métrica, gosto do estertor da ausência das palavras não ditas, não escritas, flutuantes. É disso que infinitamente gosto nas palavras, das milimétricas possibilidades que nos dão. De as dizermos de forma clamorosa, fria, quente, cálida, colorida, cinzenta, escrita, espumosa até, mas sopratutto, silenciosa. Palavras para quê? Fim do ensaio.



Marcel Khalife

Wassily Kandinski, obras de

Música: Marcel Khalife, Memories

.

Na sequência do que vimos referindo sobre Kandinsky e Schönberg, algumas das obras do pintor russo antes de aprofundarmos o tema do timbre das cores. A banda sonora da apresentação é do libanês Marcel Khalife, embaixador da Unesco para a paz. Como compositor, Khalife é autor de composições inéditas para Oud (instrumento musical), nas quais se destacam a ligação ao texto que as inspira, na sua maioria poemas de origem árabe.

(Uma animação)

19 de abril de 2008

17 de abril de 2008

Hoje: 5 razões para evocar Caetano Veloso

(por motivos óbvios aos quais não será alheio o resultado do jogo com a União de Leiria, o vídeo de Caetano Veloso foi retirado deste blog)

16 de abril de 2008

Urban Gardens

Não foi há muto tempo, nem há pouco. Mas naquele dia escreveu um poema. Não era um poema extraordinário, nem ela era brilhante nisso. Nem o era a tirar fotografias, embora gostasse muito de fotografias. Era contudo extraordinária no gosto que tinha pela vida; passava horas a imaginar formas de tirar da vida o que esta tinha para dar, como um fósforo, que se acende e depois volteia na mão com cautela para permitir que se queimem as duas extremidades. Não, não era uma criadora, apenas buscava o intenso, percorrendo sempre o perímetro exterior do limite do razoável, perseguindo se necessário a própria sombra. Tinha uma lucidez extrema, um gosto apurado e uma infinita capacidade de análise que a esgotavam e consumiam nos repetidos momentos em que se entregava à categorização sistemática das suas observações. Atravessava então, quando o fazia, aquela linha do razoável.
De modo que a poesia constituía por vezes o seu abrigo, senão mesmo o único abrigo que lhe permitia fugir da realidade intensa e dolorosa do mundo. Afligia-a a vitória do bem, o bem tinha de vencer sempre.
Naquele dia escreveu um poema. Fê-lo numa folha de papel colorido arrancada de um bloco de notas com argolas em espiral da Tate Modern que me entregou fazendo-o serpentear entre os pratos, talheres e chávenas dispostos sobre a toalha de linho branco que cobria a mesa da esplanada onde tomavamos o café matinal. Tirou-me uma fotografia enquanto eu lia o que escrevera. Quando terminei, recordo-me que nesse preciso instante senti necessidade de me levantar da mesa contornando-a, e beijei-a porque fui invadido por uma imensa ternura. Abracei-a. E senti então a plenitude da felicidade imensa que no momento me invadiu. Experimentei a mesma sensação há pouco tempo, enquanto contemplava uma pintura de David Alfaro Siqueiros numa galeria em Berlim. Dobrei e guardei o papel colorido como um tesouro que li e reli vezes sem conta nos dias e anos que se seguiram, até que o perdi sem que me conseguisse recordar onde. Já não me lembro do que dizia, chegam-me hoje, apenas, os três primeiros versos:
.
os nossos pensamentos,
nada mais existe para nós
senão este estado exprimível por quatro letras
Tinta sobre pele
O mar hoje
Praia do Porto de Pesca de Quarteira
.
Hoje
queria ter partilhado um café
em frente ao mar
enquanto ouvia os gritos das gaivotas
cedo
na entrada da barra
ao despique pelas carcaças
arremessadas pelo verdugo
Hoje
queria mostrar-te o Sonho Azul
a chegar da faina
um pequeno ponto branco
junto ao farol de barlavento
Hoje
queria saber da tua vida.

14 de abril de 2008

Encosta-me os teus desencantos
e voa,
o melhor

é o pior também
enquanto considerares o amor uma arte.

10 de abril de 2008

Sobre: o mar é a morte ou o amor incondicional

Tive amigos que morriam, amigos que partiam
Outros quebravam o seu rosto contra o tempo.
Odiei o que era fácil
Procurei-me na luz, no mar, no vento.
.
Sophia, O Mar
.
O avô ainda não era avô. Nem pai, nem marido, nem contramestre. Era apenas uma criança quando a sua mãe morreu e ele deixou de ir à escola. Depressa esqueceu o que tinha aprendido, a caligrafia, os reis de Portugal (o último havia partido poucos anos antes), os rios, as cidades. Começou a trabalhar, primeiro na fábrica de conserva de peixe e depois no mar. Costumava recordar-se da primeira noite no mar, do empurrão do bote para a água gelada, do escuro, do fervilhar do peixe na rede, dos gritos dos homens no cerco, do frio nas mãos e na gola molhada do casaco de lã espessa. Com o passar do tempo, os outros pescadores passaram a ser a sua família e por isso a chegada a terra, já de manhã, significava apenas que iria para uma casa onde se sentia só. Um dia isso mudou. Encontrou a avó. Esta reensinou-o a escrever o nome numa caligrafia tremida e a fazer as contas do pescado. Lia-lhe histórias ao entardecer junto à roseira no lado de fora da cadeia da vila. Casaram na igreja. O avô continuou a ir ao mar. Pedalava todas as manhãs na velha pasteleira cheia de cromados a caminho da praia. A avó tinha medo, mas não deixava que o avô sentisse isso. Assim, todas as manhãs, esperava no areal, junto das outras mulheres, pela chegada dos botes coloridos que a pouco e pouco se iam aproximando da rebentação. Acontecia-lhe por vezes ir de madrugada até perto da costa a ver se distinguia a lanterna do avô no meio das outras que se avistavam ao longe, reluzindo no escuro da faina. Sossegava quando via o mar calmo sob a luz lunar e não pregava olho a noite inteira quando o pressentia revolto. Numa manhã, o bote do avô não regressou, quando o avô e a avó já eram pais de um rapaz. A avó vestiu-se de negro, pôs um lenço na cabeça e desceu à praia. Molhou os pés na água, ela que nunca o fazia, nem sabia sequer nadar.
O avô chegou mais tarde, tinha havido uma avaria no motor e passaram o dia no mar a tentar arranjá-lo. Chegou esgotado, viu-lhe o luto e enfureceu-se: "Eu não morro, entendes? Sobretudo não morro no mar. Eu volto sempre, sempre, para junto de ti. Não quero nem hei-de morrer sem ser ao teu lado e quero morrer antes de ti para não suportar a dor da tua perda. Tu és mais forte que eu, ouviste?" A avó soluçou, deu-lhe um abraço e pediu-lhe desculpa por ter duvidado dele.
O avô cumpriu o prometido. Mesmo quando o motor voltou a avariar, ou quando uma tempestade terrível virou o bote numa ocasião, a avó não desceu à praia. Prendeu o cabelo no alto da cabeça. Mesmo quando lhe trouxeram a notícia do bote que dera à costa, ela limitou-se a dizer que o avô tinha prometido que voltava sempre. Era em Agosto. Dois dias depois o avô voltava. Exausto, mas voltara, tinha sido socorrido por uma embarcação espanhola e por isso demorara mais a regressar. A avó abraçou-o e manteve-se serena. Nunca mais duvidou.
O avô e os outros homens passaram duas semanas a reparar o La Forza del Destino. Quando terminaram, o avô regressou ao mar e a vida continuou.
Quando as embarcações chegavam, o avô, já contramestre, tinha direito à primeira escolha do pescado. Dava-o a amanhar a uma das mulheres e então chamava um rapaz da praia, mandava-o a casa levar o peixe, onde a avó aguardava nas lides e contas domésticas. O filho mais velho ia ocasionalmente à praia com o cão, a ver o loteamento do pescado e o leilão na areia, muito antes da construção da velha lota. Por vezes ainda ia a tempo de assistir à subida dos barcos retardatários pela parelha de burros, com a ajuda de braços dos homens, deslizando-os sobre tábuas de pinho ensebadas colocadas na areia. Isto passou-se anos antes do Manel dos Tractores comprar um Deutz, que veio substituir as parelhas de burros.
O avô almoçava com a família e depois regressava à praia para amanhar as redes danificadas pelo peixe. Levava então a boina de terra e roupa de trabalho, os pés nus para melhor desentrançar a rede. A avó ia mais tarde, com as crianças, à praia, o cesto da merenda numa mão e a sombrinha na outra, a ver o avô trabalhar. Regressava mais cedo para preparar a janta e o farnel da madrugada. Nunca se aproximava da água, o mar metia-lhe medo, sentia-se mais segura em terra. O avô, por sua vez, confiava mais no mar e era naquela língua estreita de areia fina que os seus elementos se encontravam. A avó nunca foi do mar, nem o avô da terra. Eram diferentes, completamente diferentes, mas era nessa diferença que o seu amor se alicerçava.
O avô morreu em casa, na cama de ambos. Já tinham então três netos. Chorou na manhã em que partiu. Apertou, com as forças que lhe restavam, a mão da avó, e partiu serenamente. A avó não chorou. A sua dor imensa não lhe permitia chorar. Tê-lo-à feito na solidão em que a encontrei por vezes, nas ocasiões em que desceu à praia a ver a partida dos barcos, a chegada, o amanhar das redes, ou quando um rapaz da praia lhe trazia o pescado a mando de um antigo rapaz da praia, já pescador.
A avó sobreviveu ainda vinte anos. Já bisavó, foi a enterrar num dia de sol, na campa do avô. Este ano é o do centenário do avô.

[REC] Filme sensação do Fantas 2008

  • [REC] trailer

O medo em directo, depois de Blair Witch Project.

7 de abril de 2008

Wassily Kandinsky: a Teoria das Cores

Tabela ilustrativa da Teoria das Cores segundo Wassily Kandinsky(*)
In Concerning the Spiritual in Art
(clique na imagem para ampliar)
(*) v. post anterior

4 de abril de 2008

O timbre da cor - os "gémeos" Kandinsky e Schönberg

Wassily Kandinsly
Impression III (konzert),1911
.
Em 02 de Janeiro de 1911 Wassily Kandinsky, de visita a Munique, assistiu à exibição de várias composições de Arnold Schönberg. Impressionado pela qualidade musical das peças, pintou pouco tempo depois o quadro Impression III (Konzert) reproduzido acima, depois de ter realizado apenas dois esboços. A gravura retrata a tensão entre o amarelo e o preto, que o pintor descreve assim, no ensaio Concerning the Spiritual in Art: “Light yellow [...] on black [...] has such a strong effect that it flies off the background, floats in the air and jumps into the viewers' eyes". “The black piano is the material source of sound, yellow, on the other hand, is the immaterial source. The yellow floods out to the side of the piano, flows downwards in a swinging movement, around the audience, and rises once again to the musicians in the orchestra, and from there finally settles as a round patch in front of the white, slanting columns”.
.
Duas semanas após o concerto, Kandinsky e Schönberg estabeleceram contacto entre si, que foi sendo sucessivamente aprofundado, tendo os dois génios criado uma relação de profunda amizade e proximidade, que durou até ao momento consubstanciado pela ruptura retratada na carta transcrita abaixo. Na verdade, ambos se interessavam amplamente por música, pintura e teatro. Mas sobretudo tinham um interesse específico pelo estudo do timbre da cor. Já aqui se falou no tema a propósito da pintura de Gotthard Graubner e da música de Vivaldi, mas agora falamos de estudos mais ou menos científicos de duas figuras contemporâneas (enquanto Vivaldi e Graubner estão separados por mais de trezentos anos) com trabalho publicado que serviu de base a outros estudos científicos. Antes de trabalhar com Schönberg, Kandinsky havia colaborado com o russo Thomas von Hartmann e havia publicado o trabalho Der Gelbe Klang (O Som do Amarelo), que aliá serviu de base para um trabalho exposto no Museu do Chiado, em Lisboa, em 2006.
.
Poucas vezes na história da arte existiram, como Kandinsky e Schönberg, dois gémeos tão profícuos.

Wassily Kandinsky, 1911, Sketches 1 e 2 de Impression III (Konzert)

[ A ver se percebi bem a ideia: o comentário da Tê ao post anterior transformado em verso]

Arnold Schönberg, sketchbook
.
Agora, agora que a tempestade
e tudo o que com ela veio
passou
O Inverno e o fogo da lareira enfim distantes
os primeiros cantos dos rouxinois
dissimulados nas figueiras-passajotas
junto ao caminho
Dizia
agora,
posso enfim criar-te
como ninguém soube.
E Provavelmente nenhum deus
[saberá].

3 de abril de 2008

Roses, 1915, Pierre Auguste Renoir
óleo sobre tela

.
Tu es loin
Je ressens la distance
Et le murmure anthropomorphique
du silence de ta voix
Tu es une vague
une rose flottante
Ton nom désormais un trésor
Ta chanson résonne toujours
Dans ma tête
Tu te rappeles de ces roses?
Je leur soutien haut la main
Ces mêmes roses dont on a patiemment
Caressé la soie de ses pétales

le long d' un cordon dunaire sablonneux

le bord salé de la mer.

Prison Break