20 de julho de 2009

Na maré vasa
uma mariposa volteia
e logo desaparece
Farewell my butterfly.
.
Treze segundos depois as portas abriram-se no piso térreo. Consuelo adivinhou o sorriso do desconhecido, agradeceu a amabilidade dq primazia do passo e precipitou-se para o exterior, mal conseguindo digerir o evidente desejo sedutor do estranho, a camisa escura impecavelmente engomada e os cabelos brancos que com esta contrastavam, crendo que o seu perfume aprisionaria aquela bonita mulher num feitiço. Consuelo reconheceu nesse instante cada homem que a tentara seduzir ao longo de uma vida. O sorriso, o relógio, os sapatos de marca, os gestos. Apoiou-se numa parede branca para recuperar o fôlego que lhe faltava, fosse pelo estranho encontro, fosse pelo calor sufocante da cidade. O desconhecido sonegara-lhe as forças, criara em si um sentimento que agora se apercebia que lhe fora imposto por Richard. Richard que a tratava tão bem, mas que ao mesmo tempo a suficava como agora o fazia o ar de Sevilha. Pensou nas crianças, de férias com a irmã em Puerto de Santa Maria. Esse mês em outros anos sabia-lhe bem, era o tempo de partilha com Javier Falcón. Mas agora não era assim, sentia-se insegura e com saudades dos pequenos. Procurou o telefone na mala e discou o número da irmã. Do outro lado, apenas o operadora lhe respondeu educadamente, sem disfarçar uma voz de sotaque asturiano. Encaminhou-se para a praça de táxis deserta. Ao fim de vinte minutos de espera, sentiu as força a abandonarem-na, sentindo a agonia de uma borboleta sem asas contorcendo-se no estômago apertado. Ligou então para Alícia Aguado, a psicóloga cega, cujo apartamento, com um dos terraços mais floridos da cidade, pouco distava dali.

13 de julho de 2009


Não tenho mais ninguém em quem pensar
Sempre que faço amor:
fico nervosa
não sei
mas esta boca sabe-me a uma boca estranha
Am I crazy?
Penso nos teus lábios [sem os tocar] há uma eternidade
Am I crazy?
Não tenho mais ninguém em quem pensar
Esta língua parece-me acre
Mas é apenas impressão minha
Tenho a certeza

I am not crazy

Os meus seios não mentem
Sonho com o teu pescoço sem par
Estas sombras no alpendre

oscilando soltas ao vento
inquietam-me como fantasmas do passado
dançando sob a luz trémula de uma vela
Am I crazy?

Wagner?
Intermezzo.
Mauvaise chance?
Wrong choice.

Consuelo Jímenez fechou a porta do seu luxuoso apartamento, certificou-se que ficara bem trancada e dirigiu-se para o elevador. Este estava ocupado, pelo que aguardou no patamar. Trinta segundos depois as portas abriram-se em par, permitindo o acesso ao interior, onde um homem bem parecido, mais novo, de roupa desportiva e barba de dois dias, a cumprimentou com um sorriso largo. Hesitou, mas decidiu entrar no espaço exíguo, sem contemplar as feições do desconhecido.