10 de setembro de 2008

Fui
caminhando sobre este dique
contendo águas frias
..
Um frenesim de espasmos
ao luar transparente
um adeus bordado de lantejoulas
.
imerso pelo tempo
.

A noite fora maravilhosa. Richard telefonara a Consuelo a meio da tarde, pedira-lhe que se organizasse com a ama das crianças de forma a que não passasse a noite em casa e prometeu que a apanharia à porta de sua casa às cinco da tarde. Consuelo teve tempo à justa para organizar os jantares da noite no Asador Jímenez, enfiar-se no carro rumo a casa, verificar que os trabalhos de casa dos dois mais crescidos estavam feitos e mudar de roupa, optando por um vestido curto e justo de tom neutro, complementado por um casaco de malha da mesma cor e maqulhagem discreta, o que nela era pouco usual. Richard teve a sua costumeira pontualidade britânica e pouco antes das cinco o táxi estava estacionado à porta do luxuoso prédio onde residia Consuelo Jímenez. Em plena avenida Kansas City, Richard não lhe disse onde iam e uma hora depois embarcavam no vôo IB7543 com destino a Madrid, onde tomaram em seguida o FR 5474 da Ryanair com destino a Girona. Chegaram ao aeroporto às oito e meia da noite, tomaram a direcção de Roses, rumo à Cala Montjoi e às nove e meia o casal estava sentado na mais central das mesas de El Bulli, diante de um par de frío-calientes de infusión de piña verde de pino con piñones tiernos. O jantar foi perfeito, Richard superou-se em atenções com Consuelo e depois do jantar caminharam um pouco pelo paseo junto às águas do Mediterrâneo, ouvindo a água de encontro às pedras da marginal, antes de rumarem ao hotel Vistabella, onde chegaram quando a lua atingia o zénite. A noite estava cálida. Durante o percurso Consuelo encostou por diversas vezes a cabeça no ombro de Richard. Estava tudo a acontecer depressa com ele, como sempre sonhara. No quarto de hotel aguardava-a uma camisa de noite de seda e um nécessaire completo, onde não falhara sequer o pormenor de haver um frasquinho do seu perfume preferido. Consuelo sorriu e viu os dentes brancos de Richard reflectidos no espelho polido por cima do lavatório e, rodando sobre os calcanhares, abraçou Richard que a observava encostado à moldura da porta. Sentiu os seus braços espessos envolverem-na pela cintura.

1 comentário:

Anónimo disse...

Porque será que há "adeus" que já nem doem?

Porque há momentos que partir tem este sabor de bordado de lantejoulas?

Porque há mergulhos no rio, quando queríamos muito ficar na praia?

Pedaços de desconcerto no rendilhado dos dias! Nem sempre o amor leva à transcendência. T