Ainda regressando ao tema do timbre da cor: os instrumentos de corda maxime o violino e um bom piano serão porventura os que melhor expressam a ideia subjacente ao timbre da cor, ou se preferirmos, à tonalidade do som da nota. De resto, poucos compositores conseguiram expressar tão bem a ideia do timbre da cor quanto Vivaldi. Mas será efectivamente assim? E se é, porque o é? Igor Stravinsky referiu à saciedade que Antonio Vivaldi não escreveu quinhentos concertos, mas sim quinhentas vezes o mesmo concerto. Terá o compositor russo algum tipo de razão? Seja como for, a expressão ganhou força e Antonio Vivaldi caiu em desgraça no dealbar do Séc. XX, e só recentemente foi reabilitado nos círculos mais eruditos. Mas Vivaldi foi de facto um génio? Serão os seus concertos uma monótona repetição, ou uma fantástica variação do modo, uma ténue variação do tom, do timbre que faz a diferença? Será tal variação suficiente para permitir a catalogação da peça como algo novo?
Como qualquer peça, o leque de interpretações permitidas é que muitas vezes define a respectiva riqueza da obra. E no campo da interpretação, Vivaldi é riquíssimo na amplitude de interpretações, de variações, de timbres, que a sua composição permite. E porque será assim?
Provavelmente não haverá apenas uma resposta, mas Vivaldi teve a sorte de viver no período mágico do apogeu dos Stradivarius. e tais instrumentos foram determinantes para a sua obra. Há já algum tempo que me debruço sobre esta matéria, pelo enigma que representa. Há cerca de três anos li um artigo escrito por Joseph Nagyvary, um hungaro, especialista em bioquímica, radicado nos Estados Unidos, no qual relatava que através da análise das cinzas de lascas de verniz de alguns dos melhores Stradivarius e tambéms dos Guarneris, chegou à conclusão que os mestre lutiers da época dourada dos violinos teriam trabalhado em estreita colaboração com os fabricantes de verniz locais de Veneza ou Cremona, por forma a elaborararem um verniz resistente aos insectos da madeira, uma praga comum na época. A análise da cinza do verniz permitiu isolar uma percentagem elevada de boro, que todavia não é suficiente para explicar tudo o que diga respeito à superior qualidade acústica dos violinos Stradivarius, pelo que o mistério permanece.
Após quase trinta anos de pesquisas, Nagyvary conseguiu produzir um violino capaz de ombrear com os mais fracos Stradivarius. Todavia, a primeira série de instrumentos de Stradivari mantém-se como a referência, o padrão (da cor) pelo qual afinam os demais violinos. Porque, tratando-se de um Stradivarius, dificilmente será igualado, pela extraordinária concorrência de factores que pode ter contribuído para o impressionante resultado final.
A obra de Vivaldi está irremediavelmente aliada à extraordinária qualidade dos Stradivarius, que, sem dúvida, beneficiaram, por sua vez, das teses de Giuseppe Tartini, a que já se fez aqui referência. Na tese principal de Tartini brilha a teoria do timbre médio (terzo suono), que sumariamente explica que na vibração sonora de um corpo existe uma diferença entre a tonalidade emitida pela vibração e aquilo que o nosso ouvido de facto percepciona. O que permite um leque enorme de afinações para os diversos instrumentos musicais, mas em particular para os instrumentos de corda. Sabendo isto, o executante de uma partitura poderá adaptar a afinação do instrumento ao ouvido da audiência, ou às condições acústicas do ambiente em que a peça é executada. No lado da composição, a música poderá incluir vibrações/variações de tonalidade discretas em que as notas sobem ou descem décimas de tom dentro de um mesmo tempo de compasso, enriquecendo extraordinariamente a música, se houver um executante com uma sensibilidade fora do comum para a realizar. Por comparação, dir-se-á o mesmo de uma pintura monocromática, não necessariamente minimalista por isso, mas na qual ou da qual se pode extrair uma riqueza que uma mistura obstinada de cores não consegue traduzir.
Voltando ao tema, o principal obstáculo que Stravinsly porventura teve ao apreciar a obra de Vivaldi terá sido a diferença de estilos; enquanto Stravinsky é um precursor da realidade musical contemporânea, Vivaldi representa por sua vez a musicalidadade clássica, sendo porventura o primeiro compositor monocromático, estilo particularmente evidente n' As Quatro Estações. O seu portanto a seu dono.
2 comentários:
Sorry.Seems & sounds clever, but surely cant agreee with it...It's nonsense.What was on your mind?Congrats for
the other posts!
Caro(a) Anónimo(a). Obrigado pelo cumprimento em relação aos demais posts. Em relação a este, admito perfeitamente que seja disparate e respeito a opinião ou o maior conhecimento, se disso se trata, evidentemente.
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