15 de dezembro de 2010
Sobre se: há bons pianistas a Sul?
11 de dezembro de 2010
Al Vent
Em idos da década de sessenta ansiava-se por liberdade por toda a Península Ibérica. Do lado de lá da fronteira, como cá, multiplicavam-se as canções ditas de intervenção ou, como se designam na Catalunha, "nova cançó". Porventura das mais livres de todas, a voz de Raimón (Ramon Pelegro Sanchis) entoava "Al Vent". Lembro-me de a ouvir no rádio do carro familiar, quando se ia a Espanha, na década de setenta. O ritual da fila para o ferry que atravessava o Guadiana entre Vila Real de Santo António e Ayamonte, sob vento forte, a despeito da distância da Catalunha. Há dias, um sopro de vento mais forte na estrada trouxe-me de regresso aos ecos dessa liberdade que só o vento proporciona, primeiro cantada, depois reivindicada e finalmente celebrada. Quase em simultâneo, lá como cá, o vento soprou liberdade. Nestes dias de vento forte, de tempestade, as palavras de Raimón levam-me à infância, às memórias que não diria esquecidas, mas guardadas em qualquer lugar. O vento tem essa propriedade, de arejar as memórias, de as soltar sem nenhum plano pré-determinado. "Al Vent", ouvido quase trinta anos depois desse tempo, traz-me hoje, para além dessas memórias, a consciência de algo que se nos cola à pele: um grito de liberdade, de espaço interior, algo que se assemelha ao voo de uma ave sem destino por todos os mares do mundo.
Mas ao mesmo tempo, a informação à distância da ponta dos dedos, resolvi navegar noutro oceano. A internet mostra-me que Raimón, o valenciano que canta em catalão, hoje septuagenário, viveu sempre prisioneiro da sua canção. Talvez a palavra seja demasiado forte, porque as músicas não aprisionam, mas a verdade é que "Al Vent" se colou ao artista como uma segunda pele que nunca conseguiu despir. Persegue-o. A canção, uma das suas primeiras, leva já cinquenta anos e continua a ser o seu ícone, ultrapassou o criador. Cinquenta anos de uma carreira ao vento. Em 1993, aquando dos trinta anos da canção, houve um majestoso concerto no Palau Sant Jordi, em Barcelona. Estiveram presentes Paco Ibañez, Joan Manuel Serrat, Mikel Laboa, Pete Seeger, Pi de la Serra, Daniel Viglietti e até Luís Cília. O público acorreu em massa para celebrar a canção. Raramente uma única música teve semelhante protagonismo nem simbolizou tanto: a resistência contra o franquismo, o nacionalismo catalão, a liberdade de um povo. E no entanto, Raimón é considerado um traidor entre os seus de Valência, ele que se diz um "catalán de Xàtiva". Talvez porque cante em catalão e porque se diz catalão. Xàtiva é uma aldeia da "Comunidad Valenciana", situada na margem direita do Albaida e para muitos valencianos, dizer-se catalão constitui uma ofensa. Há coisas que o vento não apaga, mesmo após soprar durante décadas: as palavras, as memórias, as recordações. Tudo persiste. Por vezes, essas recordações são arejadas e regressam. Assim as músicas, os sentimentos, as emoções espalhados. Ao vento.
Al vent,
la cara al vent,
el cor al vent,
les mans al vent,
els ulls al vent,
al vent del món.
I tots,
tots plens de nit,
buscant la llum,
buscant la pau,
buscant a déu,
al vent del món.
La vida ens dóna penes,
ja el nàixer és un gran plor:
la vida pot ser eixe plor;
però nosaltres
al vent,
la cara al vent,
el cor al vent,
les mans al vent,
els ulls al vent,
al vent del món.
I tots,
tots plens de nit,
buscant la llum,
buscant la pau,
buscant a déu,
al vent del món.
24 de novembro de 2010
Um poema em 128 segundos
A madrugada avança
Notas de música fria
húmidas
desenroladas numa pauta
ouvem-se ao longe
uma mulher chora.
A minha mão saltita no papel
acendendo aqui e ali uma vela
de esperança e pureza
Os meus pensamentos enrolam-se
batem num muro de palavras
O meu poema tinge-se de negro
talvez o meu melhor poema
Digo negro?
pelo que contém e não pela forma
como se edifica
Desbasto-o. Nenhum muro é suficientemente sólido
perfeito, eterno
e este muro que aqui deixo esta noite
fria, húmida
fragilizado
no corpo recém edificado onde se alojam já frestas por onde cresce a hera
amanhã a cal que o reveste secará ao sol
como a minha pele plena de sal
gretada pelas lágrimas que já soube derramar
Pela manhã haverá sol
e o meu muro
sólido, abrigará na sombra os lírios de que tanto gosto
enquanto no lado solarengo
se aparam os espinhos às rosas.
A minha carne soçobrará por fim ao cansaço da noite
e o meu sangue talvez abrande vergando-me ao sono
da manhã
Sorrio antes de enlouquecer
as palavras doem
o Sol já alto acode-me
na falta de limpidez do meu pensamento
Raio de luz
uma chama acende-se nos telhados
enquanto se desmorona por fim o muro
e se libertam em catadupa as palavras
que o meu coração aprisionava há pouco.
Hesperion XX Jordi Savall - Polorum regina omnium nostra .mp3 | ||
Found at bee mp3 search engine |
1 de novembro de 2010
Um profundo adeus
19 de outubro de 2010
18 de setembro de 2010
(Do not) Shoot the bear
19 de agosto de 2010
Águas de Março
4 de agosto de 2010
14 de julho de 2010
A copa do mundo é nossa!
1 de junho de 2010
Uma outra forma de dizer adeus
Zé Luis: começámos esta tua última viagem (tu gostavas de viagens) na cama 56 dos serviços de cirurgia 1 do Hospital de Santa Maria. Lia-te poesia e um dia parámos neste poema da Sophia de Mello Breyner:
”Apesar das ruínas e da morte,
Onde sempre acabou cada ilusão,
A Força dos teus sonhos é tão forte,
Que tudo renasce a exaltação
E nunca as minhas mãos ficam vazias”.
Foste intolerável com a corrupção, com os cobardes e oportunistas. Não suportavas facilidades. Resististe à sordidez, à subserviência, à canalhice disfarçada de respeitabilidade e morreste como sempre viveste - livre.
Uma palavra para aqueles que te acompanharam nesta última viagem: para os melhores médicos do mundo, para as melhores equipas de enfermagem e de apoio, num exemplo de inexcedível dedicação ao serviço médico público. Vivi com emoção diária o carinho com que te cuidaram. Uma palavra de gratidão sentida para o Professor Luis Costa e para o Paulo Costa. E para um velho amigo de sempre o Miguel. Também para Laura e para o Jorge e para a minha mãe e toda a família que nunca te deixou.
Por fim uma palavra para aqueles amigos que inventaram uma barricada contra a morte no serviço de cirurgia 1, cama 56, e te ajudaram a escrever, a pensar, a continuar a trabalhar: o João Gama, o João Pereira e senhor Albuquerque, cada um à sua maneira.
Provavelmente uma saudade ridícula, perante a força do exemplo e da obra que nos deixaste e me foi trazido por todos aqueles que te homenagearam – a quem deixo a tua eterna gratidão. Tenham a coragem de continuar.
1 de abril de 2010
Este blog
29 de março de 2010
Caminhos cruzados
Jizz - aves
Caio em mim
o comum da crise
a solidão o vento leve
o poço e o céu.
De relance reconheço-te
a tua mensagem cheia de sol
longe da terra ave da peste.
levo ainda cópias do teu voo
foge do olhar frio
o céu é teu.
primavera primavera
insurge-te.
Piotr Tchaikovsky, IV Sinfonia, I andamento
22 de março de 2010
A campanha Sussex Safer Roads vem conhecendo um sucesso enorme, em grande parte devido à mediatização do vídeo acima, que já foi visualizado por James Cameron, Bill Gates ou a própria rainha de Inlglaterra. Visite o site da campanha para saber mais.
4 de março de 2010
The Comedians, de Peter Glenville, 1967
(todo o filme disponível no You Tube)
Viens, voir les comédiens,
Voir les musiciens,
Voir les magiciens,
Qui arrivent
Viens, voir les comédiens,
Voir les musiciens,
Voir les magiciens,
Qui arrivent
Les comédiens
Ont installé leur tréteau
Ils ont dressé leur estrade
Et tendu des calicots
Les comédiens
Ont parcouru les faubourgs
Ils ont donné la parade
A grands renforts de tambours
Devant l'église,
Une roulotte peinte en vert
Avec les chaises
D'un theâtre à ciel ouvert
Et derrière eux
Comme un cortège en folie
Ils drainent tout le pays
Les comédiens
Viens, voir les comédiens,
Voir les musiciens,
Voir les magiciens,
Qui arrivent
Viens, voir les comédiens,
Voir les musiciens,
Voir les magiciens,
Qui arrivent
Si vous voulez
Voir confondu le coquin
Dans une histoire un peu triste
Où tout s'arrange à la fin
Si vous aimez
Voir comblés les amoureux
Vous lamenter sur Baptiste
Ou rire avec les heureux
Poussez la toile
Et entrez donc vous installer
Sous les étoiles
Le rideau va se lever
Quand les trois coups
Retentiront dans la nuit
Ils vont renaître à la vie
Les comédiens
Viens, voir les comédiens,
Voir les musiciens,
Voir les magiciens,
Qui arrivent
Viens, voir les comédiens,
Voir les musiciens,
Voir les magiciens,
Qui arrivent
Les comédiens
Ont démonté leur tréteau
Ils ont ??? leur estrade
Et plié leurs calicots
Ils laisseront
Au fond du coeur de chacun
Un peu de la sérénade
Et du bonheur d'Harlequin
Demain matin
Quand le soleil va se lever
Ils seront loin
Et nous croirons avoir rêvé
Mais pour l'instant
Ils traversent dans la nuit
D'autres villages endormis
Les comédiens
Viens, voir les comédiens,
Voir les musiciens,
Voir les magiciens,
Qui arrivent
Viens, voir les comédiens,
Voir les musiciens,
Voir les magiciens,
Qui arrivent
Viens, voir les comédiens,
Voir les musiciens,
Voir les magiciens,
Qui arrivent
Viens, voir les comédiens,
Voir les musiciens,
Voir les magiciens,
Qui arrivent
Viens, voir les comédiens,
Voir les musiciens
Prefácio de um: conto climático ou em todo o caso nada parecido com isso, ou apenas o primeiro poema com uma nota de rodapé do autor
22 de fevereiro de 2010
.
13 de fevereiro de 2010
10 de fevereiro de 2010
7 de fevereiro de 2010
Edificação (II)
que te leva o sabor
das minhas palavras
transcritas da boca para o papel
Ignora o tom agreste
Recompõe-te
imagina-me apenas sentado
não agressivo
a escrever enquanto penso
num recanto inacessível do teu corpo
num sussurro
apagado
do teu coração
Imagina
uma janela
debruçada sobre o mar
liso, brilhante
de um azul monótono
igual a tantas histórias
Imagina o meu coração
a descoberto
aberto
no ponto em que secou
em que as palavras secaram
o gesto murchou
e os lábios cerraram
Recorda o rumor do vento
e nele a minha alma
a minha alma
até ao infinito
à nocturna nudez
das malditas palavras
não-ditas
.
5 de fevereiro de 2010
Edificação
em verso e não em prosa
sem recorrer à Razão
a história daquele Homem
e daquela Mulher
Da sua indecifrável ferida
do ocaso do amor
das sombras de Rimbaud
do coração
da doçura perdidas
do desespero
sem solução
Do abismo
dos corpos
sem cor
Sem nenhuma cor
Em agitação.
Mas hoje
hoje não há segredos a desvendar.
[A Maria, a Sebastião]
4 de fevereiro de 2010
2 de fevereiro de 2010
Overdose nómada
da cor da luz
ou do mel
ou antes do lume
que arde na tua ausência
hoje pintar-te-ia o rosto
com a luminosidade do amanhecer
com o gesto leve da asa
de uma ave que se eleva
do ramo da oliveira
hoje repintaria as violetas
que me prendem à terra
e o meu canto nómada calar-se-ia
como o silêncio de um pássaro
no fim da migração
hoje o albatroz
dobraria
definitivamente as suas asas
e interromperia a sua navegação
contemplando o teu rosto delicado
de menina
1 de fevereiro de 2010
Poema Al Berto
como quem acende uma fogueira
longe... do mundo
antes da chegada dos sonhos
quando se olha o mar sem se pensar
tricotar reticências...
dormindo
num movimento desordenado
exausto
de corpos desorientados
e mãos estendidas
Um rebanho de gente fascinada
por um místico
monólogo
estou
Al
alucinado
[Al]
pendurado
Acordo em
A[l]-
berto
sobres-
salto
na madrugada
lírios extemporâneos
26 de janeiro de 2010
A padeirinha de Estrasburgo
Edite Estrela foi muito criticada por discursar em castelhano (vá lá, haja boa vontade para aceitar que é castelhano). Mas pessoalmente sou da opinião que não há melhor forma de defender a língua portuguesa que a assassinar a espanhola a golpes de catanada. Consta que Zapatero não prescindiu da tradução simultânea.