28 de setembro de 2009

Cai o pano

(e depois do pano cair)
.
Tu não entendeste
a importância de um corpo metamorfoseado
em silêncio a cada grito calado
no reflexo dos amanheceres calcários da cidade

.
Tu não entendeste
a relevância de cada percurso nómada
ou o contorno longínquo dos sopés
irrigados de orvalho e geada em deriva lenta

.
Tu desdenhaste
os meus amanheceres imperfeitos
à beira de um rio imaginário
sem atenderes ao movimento dos meus lábios
.
Tu
somente as esquinas maquilhadas

das avenidas do mundo

25 de setembro de 2009

XI Encontro de Música Antiga de Loulé

A XI edição começa hoje e prolonga-se até 25 de Outubro. Imperdíveis deverão ser os espectáculos desta noite, em Quarteira, mas igualmente o espectáculo de homenagem a Handel de 4 de Outubro, na Edifício Duarte Pacheco, em Loulé e o Concert Brisé de dia 16, na Igreja de Querença.
olhar o Mar
sem pensar
é tudo o que sei fazer
sem acreditar em nada
sem tocar na água
antes Arder

[aquáticas palavras]
em lume brando
a 25 de Setembro

23 de setembro de 2009

Às voltas na blogosfera


felicita sala é romana e estudou filosofia. ouve nick cave, tom waits, seu jorge, ojos de brujo, aquaragia drom, moni ovadia, nino meloni, chavela vargas, cocorosie, harry belafonte, midlake, j. tillman, beirut, massimo giangrande, la rue kétanou, camarón de la Isla, portishead, architecture in helsinki, the dirty three, roots reggae, beck, björk, françoiz breut e klezmer. não se pode portanto falar de mau gosto musical. e para além do mais, pinta. muito bem. vale, pois, a pena passar demoradamente pelo babouche rouge.

17 de setembro de 2009


A vida escoando-se em torrente
Ruin
uma dispersão em que medito
is when man-made
sem nostalgia
becomes part of nature

Lazila pertencia à classe de mulheres que trabalhava na aldeia. Nunca tinha tido filhos e um acidente na infância privara-a dessa possibilidade, pelo que nunca um homem a tomara. O pai, primeiro, e a mãe a seguir, morreram de desgosto e cada uma das irmãs foi partindo, melhor dizendo levadas, pelos estrangeiros de passagem pela aldeia, que a troco de umas moedas descansavam a consciência do soba. Lazila não. Os seus olhos, espessos como ameixas, inspiravam receio nos homens, ao ponto de um deles se ter oferecido para a matar. O soba pensou, mas pareceu-lhe que dispender umas moedas para isso seria um desperdício. E para além do mais, quem iria buscar água ao rio, ou levar o gado a beber na secura do estio?
O ancião, acocorado à porta da palhota, deixou cair um punhado de grãos na poeira do solo e ficou a olhar para as pequenas bolas espalhadas. O conhecimento exaustivo ditado por centenas de arremessos permitiu-lhe afirmar com segurança que não choveria nessa semana. Nem talvez nesse mês e dentro de dias o rio secaria, trazendo consigo os gafanhotos que devorariam a colheita e picariam os animais, espantando-os para longe.
Chamou Izam, o filho do soba, entregou-lhe uma vara e mandou-o procurar água longe. Que levasse Lazila consigo. Ao cair do dia ela regressou, sozinha, à aldeia, trazendo uma cabaça de água equilibrada na cabeça, um fino fio de sangue escorrendo pelo canto do lábio. O soba arremessou novamente os grãos e entoou um canto fúnebre quando a fogueira foi avivada. A vida prosseguiu em seguida. O lábio de Lazila cicatrizou e a seca nunca chegou.

Road to 40

14 de setembro de 2009


Soa a deja vu e no entanto é um filme novo numa sequela que demorou mais de vinte anos a produzir. Um elenco de luxo foi mobilizado, recheado de actores e figurantes do lado de cá e de lá do Atlântico, ao nível das mais ambiciosas produções da Globo e da RTP. O realizador anterior mudou-se para o Cazaquistão com a sua santa (não sem antes passar por Londres, entenda-se) e foi substituído. Pelo caminho foi reunido o orçamento de uma superprodução sem equivalência anterior. Estreia em 2010, mas pode haver já uma ante-estreia em 2009. A não perder, num estádio perto de si.

6 de setembro de 2009

... o tempo e o vento
correndo em paralelo
entre as dunas e os canaviais
Assim fui aprendendo
que a tua boca
[a] nada sabe
como um espaço sem tempo
como um tempo sem lugar.
...
Desistiu. Alícia Aguado não atendera apesar da insistência de Consuelo Jímenez. Refugiou-se do calor e dos pensamentos que a perseguiam numa bodega onde o vinho tinto era correctamente servido muito abaixo da temperatura ambiente de Sevilha. Pediu um tinto de veraño, depositando no conteúdo da taça refrigerada a confiança de bons conselhos na organização dos seus pensamentos.